A 18 de Dezembro de 1961 o “Estado Português da Índia” foi invadido e
anexado pela União indiana. Os jornais portugueses relatavam, (já depois de uma
rendição total), a resistência heróica dos nossos soldados e da população
frente aos invasores. Segundo a nossa imprensa, o número de mortos ultrapassava
o milhar.
Todos os jornais foram uníssonos num relato que nada tinha que ver com
a realidade dos factos.
Nesta pequena história a apreciação crítica feita pelo Henrique com o
evoluir das notícias.
“Sabes que em Angola as tropas estão de
prevenção? O meu Pai enche a carta toda a falar na Índia e na sua indignação
pelo que se passou. Por aqui já começa o zum-zum dos boatos e das calúnias,
muito embora eu concorde que a nossa rádio e a nossa imprensa estão a puxar
demais ao sentimento. Não sei se leste a notícia que o correspondente francês
Martin Gordon enviou acerca do contacto com prisioneiros militares em Panjim.
Ele disse que calculava que em 2.500 as praças e em 200 e tal os oficiais,
prisioneiros. Isto dá um total, geral, de 2.700 homens. Sabe-se que há outro
campo de prisioneiros em Vasco da Gama; e sabe-se que os nossos efectivos
militares não excediam os 3.200 homens. Se a notícia transmitida pela “Reuters”
é verdadeira, então efectivamente nós tivemos muito poucas baixas para uma
verdadeira luta. Não sei, ainda é cedo para fazer conjecturas, mas os indícios
que começam a aparecer não nos são favoráveis.
Leste o “Notícias” de hoje? Diz que as
nossas baixas na Índia se computava em 1018 homens. Francamente, isto é de uma
pessoa ficar sem perceber patavina. Talvez fosse melhor a nossa imprensa não
fazer tanto “escabeche” com a nossa resistência, pois, se se confirma o número
de prisioneiros é porque a resistência foi fraca.
Ou os
jornalistas estrangeiros estão a mentir, e não se descortina a razão para
mentirem acerca de um assunto tão sério, ou é a nossa imprensa que quer fazer
ondas, o que é igualmente sujo. O que é certo é que na nossa época nunca se
sabe de que lado é que está a verdade, tão opostas são as notícias.
Evidentemente que, quanto menos homens
tiverem morrido, melhor, mas que nunca seja o caso de as nossas tropas se terem
comportado cobardemente. Enfim, tido isto é aborrecido e o pior é que este mau
período ainda está longe de acabar. Por quanto tempo aguentaremos? Já deves ter
visto que a imprensa, de um modo geral, tem atacado a Inglaterra e a América.
Acho bem, mas isso é uma atitude inútil se não passarmos para além das
palavras. Pode ser que no próximo discurso do “Mestre” já se saiba algo de
concreto. Mas, se nós continuarmos só com floreados, então bolas para todas
estas manifestações.”
Lisboa 30 de Dezembro de 1961