É semana de Natal. A
enorme falta que o Henrique faz à nossa família leva-nos a partilhar, com quem nos ler, dois
momentos especiais: o presépio de sua
casa em Sá da Bandeira - Natal de 1954 e, um pequeno texto, escrito em Lisboa,
no Natal de 1959.
"Já não sou um menino
e já não posso ver-te a ti, Menino
também, com olhar de menino para Menino! Já não tenho a minha árvore de
Natal feita para mim; já não vejo o meu presépio, por minha Mãe erguido só para
mim; já não sinto o mesmo que sempre senti. O Natal é sempre o Natal, com que
idade nós tenhamos e em que latitude vivamos, mas o Natal que eu vivo de há
dois anos para cá – precisamente desde que cheguei à Metrópole - não tem,
verdade, verdadinha, o mesmo “sabor” dos outros Natais. Parece que o adivinhei
quando saí da minha terra e a olhei saudoso, apreensivo também pelo futuro que
me esperava. Eu não tinha medo. Não tinha medo, porque sempre pensei, como
pensaria qualquer criança que poderia ser criança eternamente. Vejam só que
ingenuidade.
Quer seja ou não, o certo é que, ainda hoje, já vendo que os
meus tempos de menino não voltarão, guardo ainda em mim a secreta esperança, de
que, um dia, quando eu voltar à minha terra, talvez possa voltar conjuntamente
a ser criança, amar a vida como só a pode amar uma criança e a ter um Natal e
um Ano Novo como só podem ter as crianças. Quero voltar a olhar para as bolas
de Natal que enchiam de cor a minha árvore e a poder ver em cada uma o mundo a
meus pés; quero voltar a ver o Menino, deitado sobre palhinhas no Presépio e,
olhando-o, a sentir de novo aquela sensação de infinita felicidade, de infinita
tristeza por todos os que a não tinham como eu. Talvez que hoje, algum menino,
ao olhar para o seu presépio, possa ter pena, como eu tinha, dos meninos que
não possuíam presépio! Terá pena de mim, então! Porque será que a gente cresce
e, impreterivelmente, deixa de ter os mesmos sentimentos e as mesmas reacções?
Ah, que, se eu estivesse em minha casa e na minha terra, tenho a certeza que
poderia voltar a sentir o “mesmo” Natal, tivesse eu a idade que tivesse!"