"É uma virtude, até certo ponto, o
saber retirar a tempo. Ora, quando se vê que não temos razão, outro caminho não
nos deve restar senão calarmo-nos e ouvir – para aprender.
O Lisboeta não o sabe fazer. É um
tipo que discute a torto e a direito e, sobre tudo, que não abdica dos seus
pontos de vista, quando estes são claramente rebatíveis, quando se está a ver
de maneira inequívoca, que estão errados. Já tive oportunidade de o verificar
em conversas com colegas meus. É espantoso mesmo!, a teimosia crassa que eles tomam
para defender os seus pontos de vista. Admiro, sem dúvida, todos aqueles que,
cientes da sua cultura e do seu modo de pensar, os defendem com unhas e dentes;
mas admiro, também, aqueles que reconhecem o seu ponto de vista errado. Ora o
que tenho visto chega-me para concluir, talvez à priori, porque meia dúzia de
casos não são suficientes para os tornar com regra geral: o Lisboeta não tem
uma cultura sólida. Tem, sim, uma cultura um pouco vasta mas pessimamente
aprendida, erradamente estudada e, então estupidamente defendida.
São muitos os problemas metropolitanos.
Para já e antes de tudo, dois, eu acho fundamentais: o problema económico e o
problema educacional. Digo educacional, de preferência a cultural, porque,
antes do resto, é mister aperfeiçoar o espírito para que ele possa receber os
respectivos ensinamentos. Sem ser educado o povo não pode ser cultivado.
Primeiro cultiva-se a alma e só depois o cérebro."
Lisboa 1958