Há encruzilhadas nos caminhos que percorremos.
Ao decidir que só renunciaria ao cargo de Provedor de Justiça quando se
tornasse evidente que não havia outro caminho, o Henrique fez uma escolha. Ao
fazê-la comprometeu, conscientemente, a possibilidade de ter mais tempo para viver. “A
partir daqui não seria já curial, forçar mais a minha consciência e degradar ainda mais as minhas debilitadas condições de
saúde – que há longos meses se foram deteriorando – com um prolongamento do
mandato”.
Eu sei porque o fez. Sei, porque o
conheci desde sempre. Para que os seus filhos e netos entendam, deixo hoje,
aqui, um retrato escrito desse avô, que alguns nem chegaram a conhecer.
“É na altura em que se deixa de ser moço para
se ser homem, que escolhemos os caminhos da encruzilhada: ou se quer ser adulto
– jovem, ou adulto sem ser jovem. Toda a
gente tem o seu “Balão Vermelho”.
Ao chegarem à tal encruzilhada, uns
largam-no – e o balão arrebenta – outros
preferem continuar com ele. Destes últimos, ainda há duas
categorias a referir: aqueles que, levando-o consigo, são alvos de risota, de
desdém e desprezo; e os que também, sem o largarem, conseguem contudo que o mundo os olhe com admiração respeito e
carinho. Dois grupos que partem do mesmo princípio, que seguem o único
caminho possível para quem tem força e fé, mas que o trilham de maneiras
diferentes. Os que preferem continuar com o balão, podem fazê-lo por dois
motivos: porque o balão é algo de muito querido, que sempre os acompanhou e que
eles não querem abandonar; e os que
também preferem o balão, porque estão convencidos de que mais do que querido, é
algo de valor.
O descomunal balão, pode ser um símbolo mágico de sonho e
fantasia; mas pode - e deve – ser, além
disso, uma coisa de valor que seja digna
de ser passeada porque é forte e é dela que depende a nossa vida. Não
interessa andar só com o balão porque ele é o nosso sonho de “menino e moço”, o
nosso companheiro de todas as horas; interessa
mostrar ao mundo que o balão da juventude foi sonho quando o devia ser; é uma
força, agora, dotada da poesia da mocidade e do valor da maturidade.
O que
eu quero dizer, afinal, é que o balão que nos acompanha, representa algo de
valioso que desejamos obter. A sociedade rirá, dos que andam com o balão numa
euforia de fantasia e sonho; essa mesma sociedade fechará o sorriso e olhará
com respeito aquele que lhe mostrar o seu balão, cheio de sonho e quimera, mas
repleto de vitalidade e de provas concretas de que esses sonhos não são só
lindos por serem sonhos, mas porque são sonhos que alcançaremos a lutar.
Eu escolhi o balão; simplesmente, eu não
tenho medo de o mostrar e de passear com ele; o meu balão não é só cheio de
sonhos e quimeras: quimeras e sonhos não são para mim só símbolos – são valores
que eu transformarei, der por onde der, em realidades, para que a sociedade
admire e respeite o meu balão”.
Lisboa 1958