deixou
na aldeola natal
a jaleca garrida dos
dias de romaria
abandonou
os pais já velhos e a
noiva prometida.
mochila às costas
botou-se mares a dentro
rumo aos sertões
ignorados das terras novas
que à terra velha o
Português ia mostrando
emagreceu-lhe o rosto
lá nesses mundos de
perdição
bronzeou-se-lhe a
pele
à torreira ardente do
sol dos trópicos
calejaram-se os dedos
ao romper o solo duro
e estranho
não vacilou um só
instante
trabalhador
infatigável homem de tempera rija
machada a machadada
derrubou o emaranhado
da selva inóspita.
sacha que sacha
arcou sozinho com a
canga da desilusão
o travo amargo da
derrota.
depois
na roda dos tempos
o tempo rodou.
outros vieram
gerações novas
criaram novas
gerações
e o colono ficou para
trás
esquecido na loucura
do futuro
e na tontura do
progresso
velho e alquebrado
pendurou o ancinho
num prego da parede
lançou o último olhar
sobre a imensidão
daquela terra amarga
cumprida a missão em
que se empenhara
ficou descansando
na campa fria e sem
lápide
dos heróis
desconhecidos
Escrito pelo Henrique aos 17 anos.quando frequentava o 1º ano da Faculdade de Direito da Universidade Clássica,
Lisboa, 1958