“(…) Inserido na Europa Comunitária, vizinho da bacia mediterrânica e,
portanto, do norte de África, postado face ao Atlântico e no Atlântico –
Portugal detém uma posição privilegiada e talvez ímpar.
É que somos uma Nação multissecular, um povo culturalmente
diferenciado, e por isso enriquecido na sua unidade nuclear, um Estado
incontroversamente unitário. A tripolaridade que argamassa os caboucos do País
e do Estado, e que gera a História da Nação andarilha pelas várias partidas do
mundo – essa tripolaridade específica é um factor de coesão nacional, e também
um instrumento de potencialidades de desenvolvimento, que porventura não
soubemos, ainda, aproveitar devidamente.
A nossa mais periférica situação no contexto da Europa reclama, é
certo, que o princípio da coesão económica e social se exprima pela
solidariedade concreta dos Estados mais desenvolvidos em relação aos mais
atrasados (…).
A coesão económica e social não é, apenas, um imperativo dos nossos
parceiros comunitários, em relação a Portugal. É, do mesmo modo, um imperativo
a observar no próprio âmbito nacional. Sem ela, dificilmente se torna possível
um desenvolvimento mais sadio do todo nacional, nas suas vertentes
institucionais, económicas, sociais e culturais.(…).
Não nos iludamos: o que está em causa é de tal modo profundo, incerto,
exigente, que esta mudança vai despoletar – seguramente – o aparecimento de
modelos de vida, de educação, de trabalho, de organização, enfim, de “ser e
estar” na sociedade, muito distantes dos que eram suposto estabilizados, e
definitivamente adquiridos, há alguns anos atrás. Quais as respostas para estas
questões? Que remédios para as chagas sociais que alastram? Aonde as soluções
para os problemas cada vez mais difíceis com que as nossas sociedades se
confrontam?
Não há respostas unívocas, remédios miraculosos, soluções concludentes.
E por isso mesmo, o dever de cidadania interventiva de cada um e de
todos reganha duplicada exigência justificação e significado.
É tempo, não de buscar caminhos tecnocráticos, de despachar soluções
populistas, de facilitar o que é difícil, de atirar para os vindouros o peso
triplicado da gestão política sem horizontes estratégicos – é tempo, sim, de
readquirir valores esquecidos, reacender princípios perenes, reaprender a solidariedade
humana, repôr regras entretanto marginalizadas de civismo, de legalidade e de
justiça.”
Ponta Delgada,
14.3.1994
Excerto do discurso proferido
pelo presidente do CES na Conferência Nacional Sobre Política Social Europeia
“Livro Verde”