Após a eleição, faz um discurso em que se debruça em primeiro lugar
sobre os problemas do mundo nesse ano de 1992. Afirma que “à democracia parlamentar e ao
multipartidarismo deve estar associada a livre manifestação e a articulação
concertada dos diferentes interesses colectivos que brotam da vida social”.
E continua:
“ O tripartismo não é mais do que a transposição para o domínio das
relações sociais dos princípios fundamentais da democracia política: liberdade,
pluralismo, participação dos interessados nas decisões que os afectam. Não se
pode falar de tripartismo onde não existam organizações sindicais de
trabalhadores e de empregadores livres, independentes, fortes e
representativas.(…)
A história demonstra-nos como o sindicalismo foi, em tantas ocasiões,
um baluarte da liberdade e um motor da justiça social. Ao longo do seu
percurso, esteve sujeito a recuos e avanços, confrontou-se com adversidades
enormes e também alcançou vitórias relevantes (….)
Não partilho, todavia, a opinião
de que se deva falar de crise do protagonismo sindical. Penso que é mais
apropriado constatar-se, apenas, que os sindicatos – tal como acontece com as
diversas organizações da sociedade – viram-se confrontados com problemas e
emergências graves, para cuja resposta precisam de tempo de adaptação e
capacidade de inovação. É sempre importante, em todo o caso, que os sindicatos
sejam verdadeiramente independentes, quer do Estado, quer de outras
organizações de natureza e funções diferentes. (….)
O Estado democrático, por seu turno, não pode deixar de garantir a liberdade
sindical e o direito de livre negociação colectiva, quer no plano da lei, quer
na realidade dos factos.(…..)
Parece salutar, todavia, o
princípio de que o Estado deve deixar o campo mais vasto possível para
negociações bilaterais, seja qual for o nível em que se desenrolem. (….)
A negociação colectiva e a concertação social tripartida não são,
porém, métodos fáceis, nem processos de maturação rápida, e não se apresentam
sob modelos uniformes(…)
Mas também a democracia não é, e nunca foi, senão um sistema de lenta,
penosa e difícil construção de uma ordem política, económica e social mais
livre e mais justa. Não está nunca definitivamente conquistada, senão através
da tolerância, do diálogo, do esforço permanente de compreensão e de busca de
soluções comuns.
Isto é igualmente válido para a concertação tripartida. (….)
Não é vantajoso retardar ou bloquear as transformações socioeconómicas
porque, a prazo, os custos serão mais pesados. Mas é necessário, em
contrapartida, consensualizar as transformações julgadas úteis. A concretização
desse entendimento entre governos, sindicatos e empregadores restabelece os
equilíbrios, relança a confiança colectiva e gera impulsos decisivos para o
desenvolvimento.(…)
Se não acreditamos na capacidade do Homem, em que devemos então
acreditar? Falo do homem não em sentido abstracto, mas no Homem concreto, cuja
dignidade essencial é igual em todo o lado, seja pobre ou rico, culto ou
analfabeto, religioso ou ateu, homem ou mulher.
Essa dignidade só é atingível no respeito integral pelos direitos do
homem. Estes direitos são não apenas políticos, mas também culturais,
económicos e sociais. (…)
Permitam-me, assim, que termine expressando-vos a minha convicção de
que a democracia não é um “bem de luxo ”, próprio para consumo de países ricos.
Cada homem e todos os homens têm direito à liberdade e à justiça social. Onde
elas existirem, haverá paz na consciência dos homens. Mas enquanto não reinarem
por todo o mundo, não poderemos ficar indiferentes”.
Genebra 3 de Junho
1992