Reencontramos, hoje, o Henrique. (Caloiro da
Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa).
Aos 18 anos, recém chegado a um novo
continente que mal conhecia, a uma cidade que o assustava, a uma Faculdade
elitista onde não tinha amigos, reflectia, (qual Pensador da arte nativa angolana),
escrevendo:
“A vida em sociedade é, segunda as melhores doutrinas, derivada da
própria natureza do Homem.
Assim, o «status societatis» é um bem, necessário, imprescindível,
imperioso, pelo qual o homem alcança, ao servir-se dele, muitas das suas
fundamentais necessidades. Entre elas, a convivência com outros seres humanos não é das de somenos importância, se entendermos
que a ausência de contacto gera, na maioria, um estado de insatisfação, de
laconismo mórbido, de apática e inapropriada melancolia.
Um Homem precisa de falar com outros homens? – Tem a sociedade, a
convivência com seres de mentalidade conforme a sua, para dar lugar a essa
necessidade. Mas o Homem também precisa de «falar consigo mesmo». É
indispensável e não ridículo. Ridículo é a cobardia de se furtar ao monólogo,
jamais a capacidade de o fazer!
Olhando para dentro de si mesmo mirando o revolucionar das emoções que
se geram, e degladiam no seu íntimo, auscultando, sempre que possível, o
verdadeiro sentir do seu eu, o homem está a dar satisfação a uma necessidade de
ordem psicológica.
O que eu possa escrever, não tem interesse para ninguém, a não ser para
mim próprio, que vou cuidar de analisar o que sinto e o que penso e toda uma série de impressões que quer
objectiva quer subjectivamente eu for colhendo.
Portanto, será, não só uma introspecção em sentido filosófico - mas também uma vista de olhos pelo
que me cerca e sobre tudo aquilo que me fere a atenção.
Está a volver um ano desde que arribei a estas terras do Continente. Em boa
verdade – e contrariando as profecias dos mais velhos – eu não me acostumei, no
sentido verdadeiro de perfeita e incondicional adaptação, ao ambiente e ao modo
de vida metropolitano. Em meu entender, existe uma profunda diferença de
mentalidades mesmo de usos e até de sentimentos. Angolanos e metropolitanos entroncam no mesmo ramo, somos
portugueses.
Esta descendência recíproca é o traço mais forte da semelhança que se possa apontar entre uns
e outros”.
Lisboa
1958