quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A HISTÓRIA DE UM COLONO

Encontrei esta história, real, no livro de Adriano Vasco Rodrigues intitulado: “De Cabinda ao Namibe” -  Memórias de Angola, na segunda edição de 2011.

É a história de um jovem nascido numa aldeia da região da Guarda. Nos anos 20, do século passado, termina o então 7º ano dos liceus. É o segundo de nove irmãos. Tem que dar rumo à vida. Procura emprego. Concorre, assim, ao Quadro Administrativo das Colónias. É aceite. Embarca para Angola. Viagem longa, beliche estreito, tão estreito, que passa os dias no convés. Os enjoos, o calor insuportável, a isso o obrigam.

Luanda era, à época, uma cidade poeirenta. Longos muceques ou areais cobertos de cubatas e casas rasteiras. Calçadas, meia dúzia.

Depois de um estágio breve o nosso jovem é enviado, como “Aspirante”, para os Luchazes, nos confins do planalto angolano. Quarenta e quatro dias de marcha interminável a pé ou de tipoia. Encontro com os embondeiros. Travessia do Quanza em jangada. Para lá do Dondo uma dolorosa subida para o planalto.
Atravessa, espantado, os altos morros da Kibala, comparando-os com os cumes agrestes da sua Serra da Estrela. Percorre as chanas e as planuras do Bié. Passa por aldeamentos. Pernoita em cubatas. Finalmente, entra no território dos Luenas governado por uma rainha.

No povoado, que lhe destinaram, foi durante anos o único branco, nem padres, nem comerciantes, nem militares.
Viveu numa cubata de colono até construir com a ajuda dos africanos, a sua própria casa de adobe. Jornais e notícias não havia. Rádio não existia. O que se passava em Lisboa e em Luanda ignorava-o.
Naquela área as populações africanas andavam em revolta por causa do sal. Os brancos prometeram levar-lho mas faltaram à promessa.
Para resolver o assunto foi ao Moxico Velho. Reclamou um saco de sal e distribui-o, equitativamente, ganhando a confiança das gentes.
Anos mais tarde regressa à Metrópole para terminar os estudos na então Escola Superior Colonial, (mais tarde  Instituto Superior de Estudos Ultramarino).
Termina a sua carreira como Governador do Distrito da Lunda.  
Esta é a história do bisavô dos meus catorze netos. O seu nome, António do Nascimento Rodrigues.



terça-feira, 20 de agosto de 2013

AMIGOS VERDADEIROS

Na minha recolha de memórias encontrei histórias, poemas, pequenas notas, coisas esquecidas.
Para encontrar é necessário revolver, procurar. Está cá tudo dentro. Não sei se na alma se no coração. Em 1953, na hora da despedida - o pai tinha sido transferido do Luso para Sá da Bandeira, (o Henrique não tinha entrado, ainda, na minha vida), um poema de um mestre, de um amigo, que marcou profundamente o seu gosto pelos livros, pelo saber, e, pelo saber dizer.  



Cuidado, Henrique, porque nesta vida
Nem todos são amigos verdadeiros!
Duvida dos que forem lisonjeiros
Porque tal ralé é só fingida.

Porque uma parte – a parte mais crescida –
É feita de um punhado de matreiros
Que te abandonarão, entre os primeiros,
Numa curva qualquer da tua vida.

Escolhe com cautela! Escolhe poucos
Mas que sejam sensatos e não loucos
Dos que podem usar de falsidade

Possas este livro preencher
Com amigos sinceros, a valer,
E este livro será só o da amizade

Angola - Vila Luso 16 de Dezembro 1953



sábado, 17 de agosto de 2013

NÃO SOU NADA

Não sou morro nem penhasco.
Não sou vento.
Não sou brisa.
Da vida
Já sou só sombra
(nuvem breve,… envelhecida).

Não sou garota nem jovem
De larga saia rodada,
Não sou mãe. Não sou avó.
Não sou estrela nem cometa.
Não ando a pé na calçada.

Não sou estrada.
Sou ruela,
Talvez beco ou labirinto.
Alma negra em sofrimento
Minha saudade esquecida.

Tu não estás.

Eu não sou nada

“Porque hoje eu sei que só morrem verdadeiramente aqueles que, depois de mortos, nós conseguimos matar também. E nada é pior do que um morto vivo, habitando lado a lado com os que não morreram e tiveram a coragem de tentar viver para além da morte dos que amavam.”
IN “ Madrugada Suja” de Miguel Sousa Tavares  


sexta-feira, 9 de agosto de 2013

QUANDO BATE UMA PORTADA


Agosto. Tempo de férias. Memórias das casas. De férias. Das nossas férias.   Das sonhadas. Das vividas. Sempre em família.
De início - Os Brejos de Azeitão. Depois “O Casaleco” em Cabanas, Palmela, e a praia da Figueirinha. A partir de 1979, “O Casal Saloio” e a praia do Baleal. Finalmente “A Casa da Takula”, as grandes portadas em madeira de Angola, e, as nortadas constantes neste mês de Agosto. No teu blogue, Henrique, as memórias e as saudades.

QUANDO BATE UMA PORTADA

Neste castelo encantado
Nascido
Aqui
No mar
Há uma portada que bate
E
Não me deixa
Sonhar

Das ameias do castelo
Vejo
Um barco
A navegar
Deixa um rasto de loucura
E
Não me deixa
Pensar

Loucura neste castelo.!

Desfaz-se a identidade.!
Nada fica.
Nada sobra
Quando cá bate a saudade.

Saudade de ti.
De tudo.

Do mundo que construímos
Neste castelo encantado
Erguido
Perto 
Do mar.
Quando soa
Esta nortada
Nem sou capaz
De chorar

Não sou capaz de chorar
Já não consigo viver
Neste
Castelo encantado
Nascido
À beira mar

Quero voar

Ser gaivota
E correr ao por do sol
Quero ser Tu.
(Re) nascer.
Porque bate uma portada
Neste castelo
(Encantado)
Erguido
Bem junto ao mar


domingo, 4 de agosto de 2013

O BOM NOME É QUE É O TESOURO

A história, que, reproduzimos com todo o respeito, foi-nos transmitida pelo Professor Adriano Vasco Rodrigues, neto da Avó Josefa do Nascimento e do Avô José Rodrigues.
Tem a ver com uma “moca” de estudante, “moca” centenária, transmitida de geração em geração, e, que se tornou no símbolo de uma família de estudantes – os nove filhos da Avó Josefa e do Avô José. Chamava-se “zefa” ( a moca).
É duro ser guarda fiscal e ter nove filhos a estudar. Estudava um, começava a trabalhar, ajudava o segundo e assim sucessivamente.  A “moca” passava de mão em mão, responsabilidade assumida, responsabilidade transmitida.
“  Do casamento de José e Josefa resultou larga prole – filhos, netos, bisnetos, trinetos. As suas carreiras profissionais foram sempre alcançadas pela via do estudo, tornando-se médicos, advogados, engenheiros, arquitectos, gestores, professores etc. , exercendo das mais simples às mais elevadas funções públicas. Quando Josefa do Nascimento, já idosa, entregou a “zefa” ao segundo neto ao entrar para a Universidade de Coimbra, disse-lhe como se se tratasse de uma investidura medieval:
Não te esqueças que o estudo libertou a nossa família da servidão da terra e nos deu o maior tesouro que nos acompanha a todo o momento e não ocupa espaço – o saber. Não te deixes seduzir pelas outras riquezas. O bom nome é que é o tesouro. Leve o diabo arcas de ouro” 
  


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

AS ORIGENS

O Ouvidor do Kimbo. O blogue do Henrique. Das suas histórias. Das suas memórias.
Conto, hoje, a história da origem. Origem do nome. Do nosso. Nascimento Rodrigues.
Os personagens – Josefa do Nascimento e José Rodrigues. Uma aldeia, algures na região da Guarda
Josefa do Nascimento é filha de um abastado proprietário de Prados, que abandona a mãe, grávida, para outros voos matrimoniais. Josefa é acolhida pelos padrinhos, (família nobre), juntamente com a mãe, que trabalhará como governante. Sorte de Josefa. Os padrinhos têm uma filha da mesma idade. Josefa é educada com ela. Aprende a ler, escrever, calcular, bordar, tocar piano e falar francês, como qualquer jovem bem nascida nesse final do século XIX.
José Rodrigues é filho de José Rodrigues Subarro, pequeno agricultor em Aldeia Viçosa. Analfabeto. 98% da população era analfabeta naquela zona da Guarda.
José Rodrigues conhece Josefa do Nascimento quando cumpria o Serviço militar na Guarda. Apaixonam-se. Casam na Sé da Guarda no ano de 1899. Josefa do Nascimento ensina o marido a ler, escrever e contar. Em dois anos prepara-o para o exame da 4ª classe. Josefa do Nascimento e José Rodrigues tiveram nove filhos. Deram origem à nossa família – Nascimento Rodrigues.