quarta-feira, 19 de maio de 2010

Para si, meu Pai

Deixamos hoje 2 cartas escritas por Gonçalo, 5º filho, uma na data do seu 36º aniversário (hoje), outra escrita em 19 de Março de 1984, por altura do Dia do Pai.
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Querido Pai,

Hoje é o dia do meu 36º aniversário. Foi em 19 de Maio de 1974 que nasci. Não sei se é verdade, se é a memória que me prega uma partida, mas acho que contava a Tia Teresa, por repetidas vezes, que o Pai subia as escadas de casa a gritar: «é um rapaz, é um rapaz!». Sou o mais novo de 5 filhos e irmãos por quem nutro o maior dos amores e respeito: a Ana, a mais velha, para mim símbolo de uma união entre irmãos como não há igual; o João, mais contido e reservado, um exemplo de Pai e marido, provavelmente o verdadeiro sucessor daquele a quem, há muitos anos, chamaram o “Pater-Famílias”; o Nuno, senhor de uma inteligência e perspicácia inigualáveis, com um percurso pessoal e profissional de meter inveja e que muito admiro; a Sofia, a mais maternal, a mais sentimental, mais próxima de mim no que à idade diz respeito, mais próxima de si, Pai, e detentora de um percurso profissional também esse já invejável e respeitado por tantos.
Porque assim aprendi consigo, e aprendi também a amá-los como tal, junto os meus restantes irmãos: o Raul, a Nini, a Ana Sofia, o Paulo, a Rita, a Madalena, o Gustavo e o Francisco. Por todos eles, nutro um amor infindável e neste meu aniversário, todos eles recordo com amor, respeito e admiração. A todos eles, deixo também esta carta.
Dos meus aniversários, hoje recordo e entendo os presentes que o Pai me deu: amor, respeito, família, união, serviço. Com sinceridade Pai, não me recordo em especial de algum brinquedo, jogo ou de qualquer outro bem material que me tenha dado e confesso, hoje, que não me fizeram nem fazem falta. O que o Pai me deu ao longo de 36 anos, imaterial, com muito maior significado que qualquer outro bem material, é aquilo que fica, guardo e guardarei para todo o sempre no meu coração.
Assim, Pai, neste dia, em que são passados 37 dias da sua partida, lhe digo que guardo hoje principalmente 2 coisas: o legado e a saudade.
A saudade. Essa palavra tipicamente portuguesa, difícil de replicar em qualquer outra língua, significado de um verdadeiro fado português.
A saudade. Por quem se sente de quem muita falta nos faz, quem tanto amámos toda a vida e aprendemos a respeitar.
A saudade. Imensa, pela falta que me faz, pela tristeza profunda que sinto por já não estar cá perto de nós, que aumenta a cada dia que passa, que não acalma nem deixa acalmar o meu coração. Não dorme de noite, não trabalha de dia, apenas vive no meu coração.
A saudade. Dos almoços que tínhamos diariamente no último ano, das conversas que tínhamos sobre o País, daquilo que “gozávamos” com alguns pseudo-políticos que se julgam servidores da Nação. Riamo-nos. Riamo-nos porque de serviço pouco sabem, pouco entendem.
E por isso fica o legado. Esse legado de entrega, de serviço, de colocar tudo o que temos naquilo que fazemos. De entender que Portugal não existe para nos servir, nós é que existimos para servir Portugal e a Nação.
Esse legado de respeito pela pessoa humana, de sinceridade, de frontalidade, de honestidade, de nunca nos deixarmos vergar nem levar por interesses.
Um legado de intransigência, por acreditar naquilo que faz e por acreditar que os outros também são capazes. Aquela dureza, aquela imagem de austeridade que guardava por detrás um amor infindável, terno e carinhoso.
Esse legado no qual tanto me reconheço e procuro replicar todos os dias da minha vida. No trabalho com clientes e colegas, em casa com a Marta, a Rita e o Zico, com as pessoas na rua, com aqueles com quem lido diariamente.
Esse legado que hoje passa para mim, para todos nós e que fica enraizado nas nossas vidas. Que fica connosco e com a Mãe, figura essencial, pilar da nossa família, dona de uma sabedoria como nunca vi em ninguém.
E agora que o Pai partiu, por entre tantas coisas, tanto sentimento, guardo com toda a força que tenho isto mesmo: o legado e a saudade.
E com isso vem uma enorme responsabilidade que, com sinceridade, sinto. A responsabilidade de fazer jus ao seu nome e que prometo Pai, tudo farei para o honrar: Nascimento Rodrigues significará para mim, sempre, família, entrega, serviço, honra, respeito, frontalidade, amor. E tudo, aqui, nesta terra que muito amo: Portugal.