terça-feira, 7 de setembro de 2010

Notas Ultramarinas - A Juventude e o Ultramar

Muita gente – em especial a gente adulta – ainda não se apercebeu devidamente da necessidade imperiosa de criarmos na juventude uma mentalidade ultramarina. A que propósito? – Perguntar-me-ão cepticamente aqueles que não entendem estar a razão da nossa existência dependente do ultramar. Quanto mais não seja – responder-lhes-ei já – para que possamos sobreviver como uma nação que, de há cinco séculos a esta parte, não tem um cunho exclusivamente europeu. E para quantos, por ignorância ou indiferença, se não decidiram ainda a tomar a peito o problema, eu vou pô-lo em termos propositadamente simples e angustiantes: que será então de Portugal – Portugal Europeu, Africano, e Asiático – se as gerações de amanhã quando chamadas a tomar sobre os ombros o pesado encargo de guiar o País, não trouxerem da sua mocidade uma visão, tanto mais esclarecida quanto possível, do que nos impende prosseguir em terras do Ultramar? Há alguém tão imprudente que esteja pronto a duvidar do preço alto com que teríamos de pagar o erro da inexistência de uma juventude votada ao valor mais alto da Nação? E porque não é bom iludirmo-nos a esse respeito melhor será prevenirmo-nos a tempo e horas, perante uma falha que se faz sentir agudamente.
Ainda há dias, «O Século», em artigo intitulado «Conhecimento de Uma Realidade», chamava a atenção para o facto de ser necessário ministrarmos às gentes da Nação mais completo ensino sobre a vida do nosso ultramar.
Que nos seja permitido, agora, focar o mesmo aspecto com especial menção à juventude.
Recuso-me a admitir, naturalmente, que a actual geração não esteja em condições de lutar como outras o fizeram, pelo engrandecimento da nossa terra; duvido imenso, porém, que a generalidade possua a mais rudimentar bagagem de conhecimentos ultramarinos. Consequentemente, seja-me lícito perguntar: como pode a moderna geração erguer amanhã um Portugal Melhor, se ela caminha para esse fito na ignorância das maiores aspirações que palpitam nas unidades ultramarinas? Sim – como pode a juventude cumprir no todo a sua missão, se a maior parte considera ainda o Ultramar como uma oportunidade de «última análise»? É mais certo um moço metropolitano debater com afoiteza, o último filme de Hitchcok, do que responder ainda que ao de leve, a qualquer pergunta sobre povoamento africano. Pergunto se não seria de inteira justiça e de indestrutível lógica administrar-lhes um ensino tão vasto sobre eles como a que possui sobre o último Benfica – Sporting.!!
Se perguntarmos a um moço do ultramar onde ficam Braga, Leiria, ou Covilhã, desde já sou capaz de apostar em como uma esmagadora maioria responderá automaticamente: na Metrópole. Em contrapartida, se inquirirmos dos rapazes metropolitanos onde se situam as terras portuguesas de Malange, Porto Amélia ou Cacheu não evidenciarão eles a mesma maioria de acerto, se não encontrarmos até um número lato que fique gaguejando assustadoramente…
As perguntas permitem-nos exprimir o desnivelamento de conhecimentos que as juventudes daquém e dalém mar reflectem acerca do Ultramar e da Metrópole, respectivamente.
Todo o moço de qualquer das parcelas do nosso ultramar, sabe decerto, o que significam Ourique e Aljubarrota: quantos porém serão os rapazes naturais da Metrópole, que tenham notícias dos feitos igualmente brilhantes praticados no célebre «Triângulo da Resistência», Muxima-Cambambe-Massangano? Não consigo entender, decididamente, a razão porque a descrição de tantas façanhas não alinhou ainda nas páginas da História que é ensinada aos moços das escolas primárias!
É mínimo o conhecimento que a juventude exprime acerca das províncias ultramarinas. As causas? Devemos ir buscá-las, com coragem e isenção, à falta de um incentivo maior e à ausência de propaganda. É uma necessidade vital dar a todos os portugueses um tão completo ensino sobre o ultramar como se lhes dá aos assuntos da Metrópole. Na actualidade, sente-se tão impressionantemente a necessidade desse ensino, que, a não o ministrarmos em grande escala e na devida oportunidade, ficaremos com uma ferida aberta por muito tempo.
Estou crente que muita coisa se pode fazer em defesa da juventude e em prol do nosso ultramar.
Tudo o que se possa levar a cabo com esse fito, nunca o julguemos em demasia. É mister, rapidamente, oferecer à juventude todos os meios adequados a proporcionar-lhe um muito melhor conhecimento do ultramar português. Jamais me cansarei de repetir que, com urgência, é preciso enfrentarmos o problema e dar-lhe a solução julgada a mais viável.
Daí o meu pedido de apoio ir mais particularmente ainda, para quantos, por sua posição ou seu esforço, estão em condições de auxiliar o fortalecimento da unidade das camadas jovens de Portugal. A esses, permito-me pedir que não façam sofrer delongas ao problema, porque está atrasada a mentalidade ultramarina da nossa juventude e porque aos olhares cobiçosos, que se lançam para a nossa África, também é de conveniência nacional opormos-lhe uma perfeita unidade das massas jovens do nosso País. Tanto bastaria para que angustiadamente, um só rótulo ousasse apor ao problema: urgente.

Diário da Manhã 10 de Março 1959