O Henrique é reeleito
para o cargo de Provedor de Justiça em 2004. Em 2005 a Provedoria de Justiça comemora
30 anos de existência. Na efeméride, o Henrique concede à jornalista Ana Sousa
Dias, da Antena 1, uma longa entrevista. No excerto, que hoje publicamos, revela-se
parte do quotidiano da Instituição.
Ana Sousa Dias - Os portugueses queixam-se muito?
Nascimento Rodrigues –“
Não faço ideia. Não sei dizer-lhe. A única coisa que eu lhe posso dizer é que a
partir da década de 90 se tem assistido a um aumento gradual, a um aumento
sustentado, do volume de queixas ao Provedor de Justiça. E é muito fácil, é
muito fácil, fazer uma queixa ao Provedor de Justiça. Pode apresentar uma
queixa por carta, pode apresentar uma queixa por correio electrónico, pode
apresentar uma queixa por tele-fax e também por telefone, (desde que haja aí um
controle sobre a autenticidade de quem está a fazer a queixa), e pode ir
pessoalmente à Provedoria de Justiça. Portanto isto é muito fácil e ainda por
cima é gratuito. O cidadão não paga um cêntimo, para além do selo da carta,
eventualmente. Não lhe sei dizer se os portugueses se queixam muito ou não.
Acho que se queixam razoavelmente.
A.S.D.- A ideia que eu tenho é que os portugueses
gostam muito de dizer mal, de se queixar, mas depois não passam á fase seguinte,
não tomam medidas para resolver o problema, ficam a queixar-se.
N.R. –“ Não. Não diria
isso. Eu diria que o que nós deparamos, muitas vezes, é com uma explicação
pouco esclarecedora sobre o motivo da queixa. Vou-lhe ser franco. Muitas pessoas
escrevem mal, incluindo pessoas licenciadas. Já recebi queixas de professores
que começam por me escrever assim: Senhor Provedor de Justiça, eu sou ‘á’ cinco
anos, ‘à’ sem h, um professor, isto não pode ser…!
A.S.D.- Dá vontade de mandar para trás…
N.R – “Não, não mando,
isto não é motivo de recusa, mas é motivo de observação. Mas não era a isso que
eu referia, referia-me a queixas de outro tipo, de pessoas que tem alguma
dificuldade em se explicar bem sobre o que é a queixa. Porque de facto, aquilo
que se nota, e, também por causa disto a beleza institucional do cargo, muitas vezes
as pessoas começam a escrever e passam a contar os problemas da sua vida, para
finalmente lá para fim, nas últimas linhas, acabaram por dizer: Senhor Provedor
é por causa disto que me estou a queixar,
mas antes de se queixarem contam um pouco a sua história, como eu lhe dizia,
isto dá beleza institucional ao cargo. Mas para responder à sua pergunta, é mais
a dificuldade em exprimirem as razões da queixa. Claro que essa dificuldade depende
do nível habilitacional do queixoso que é muito diferenciado, percebemos pelas
queixas que temos pessoas com nível habilitacional baixo, e que temos
licenciados, o que não significa, como já referi, que seja uma queixa bem
apresentada”.
ASD- Estas queixas dizem respeito, essa a função do Provedor
de Justiça, a problemas do funcionamento do Estado, embora haja também, ultimamente
queixas de conflitos com privados…
N.R. “Fundamentalmente
as queixas têm que dizer respeito às questões de ilegalidade ou questões de justiça.
Suponha, que recebeu um notificação da sua repartição finanças, para a deixar
bem disposta, que lhe aplica um imposto que é superior aquele que calculou, e,
que acha, é devido, em função do código do IRS. Ou se dirige directamente à
repartição de finanças, faz uma reclamação, e isso leva muito tempo até ser
decidido, ou faz uma queixa ao Provedor de justiça, invocando a ilegalidade que
foi cometida. Aí está, a administração pública cometeu um acto ilegal, cometeu
uma ilegalidade. É sobre isto que incide a acção quotidiana do Provedor de
Justiça”.
Lisboa, 5 de Junho de
2005.