quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Notas Ultramarinas - A ÁFRICA CHAMA POR NÓS

O problema africano, em evidência crescente, voltou a agitar os meios a ele afectos, após os recentes acontecimentos ocorridos em Leopoldville e Matadi, no Congo Belga. As ocorrências citadas, em território confinante com as nossas duas maiores províncias ultramarinas, devem merecer, por parte de todos os portugueses profundamente cônscio de uma Pátria que não se limita ao ocidente da velha Europa, um pouco de reflexão criteriosa, derivada mais da unidade que em plano nacional eles vêm recordar, do que do receio de repercussões de similar natureza que, é bom dizê-lo não afectam a estrutura das parcelas da nossa África. É provável todavia, que nem toda a gente se tenha apercebido devidamente da importância capital que, em ritmo progressivo as nossas unidades ultramarinas representam, designadamente aquelas – Angola e Moçambique – que, por suas possibilidades naturais e das que resultam do esforço humano, melhores fontes de riqueza e de glória podem vir a representar num futuro próximo. Por consequência, é possível também que muitos não tenham adquirido ainda aquele legítimo orgulho que à obra se deve dedicar sem rebuço, razão porque é mister acentuarmos – sem que de tal nos pese o pecado de sermos parciais - a necessidade imperiosa que dos mais humildes aos mais privilegiados impende, em ordem a um maior dispêndio de energias para com a missão que, de antanho encetada, deve ser hoje particularmente incentivada.
Para quem se debruce um pouco sobre o momento titubeante que a África ora atravessa, será grato depreender que, por enquanto, os territórios portugueses daquele vasto continente podem contrapor ao trabalho de sapa que vem minando terras africanas, uma muralha portas adentro da qual se ministram lições da melhor mestria; mal aviado ficará contudo, quem daí comodamente deduzir que livre de perigo futuro está a obra em que nos empenhámos e temos que saber fortalecer os alicerces.
A nossa História demonstra-nos que da jornada ultramarina temos colhido frutos de insuperável valia e mostra que uma propaganda modesta não pôde oferecer ainda uma glória merecida; aqueles estão emoldurando um troféu de que há muito a esperar, mas as páginas de triunfo que as passadas coloniais escreveram, continuam aguardando uma consagração mais adequada ao seu merecimento.
Como pensar pois, que da obra erguida a sua jornada finalizou, já porque frémitos de acirrado nacionalismo estão sacudindo o corpo africano e o lançam em movimentos de imprevisíveis consequências? Do mesmo modo, pior avisado andará quem for deduzindo por ingenuidade, que a nossa acção é por completo imune ao perigo que alastra em roda e ronda aquelas terras, de que cinco séculos de trabalho honroso definiram as fronteiras e marcaram para elas uma posição altamente humanitária. É tão impossível que a Raça venha a perder as suas virtudes colonizadoras – de que adviria o fatal desmembrar de um Império, de que não podemos prescindir jamais sem coarctar o corpo pátrio – como crasso erro seria não reconhecer que o Ultramar tem que ser alvo, hoje mais do que nunca, de uma particular atenção e de um uníssono cerrar fileiras em torno dele, que nos venham a permitir, com êxito, fazer frente a ideias actuantes contra o legitimo direito das nações titulares de territórios africanos.


Henrique Alberto do Nascimento Rodrigues
Diário da Manhã nº 9931 13 de Fevereiro de 1959