sexta-feira, 4 de novembro de 2011

O DESAFIO RESPEITA A TODOS NÓS

A 13 de Setembro de 1983 o jornalista do “Diário de Notícias” do Funchal faz a seguinte pergunta ao Henrique:

D.N. – O pretexto de que consumimos para além das nossas possibilidades não serve para a generalidade dos portugueses. Estes aumentos recentes recaem também, negativamente, sobre reformados, viúvas etc. Não são também portuguesas essas pessoas?

N.R.- Deixe-me dizer-lhe que aprecio bastante a tónica social-democrata que coloca na parte final da sua pergunta, e, isso, naturalmente, que me preocupa como social-democrata.

Temos a obrigação política de procurar que as camadas populacionais de menores rendimentos, ou de rendimentos mais afectáveis pela evolução do custo de vida, sejam proporcionalmente menos atingidas do que outros sectores da população. Isto pode procurar-se por várias vias, designadamente a via fiscal, a da segurança social e a da saúde e transportes.

Mas nada, ou pouco é possível fazer-se sem receitas. E para haver receitas é necessário produzir-se, por um lado e, por, outro, não se delapidar o que existe.

Não é só o Governo que é responsável pela adopção de medidas nestas áreas. Todos nós cidadãos activos, também somos responsáveis. Por exemplo: porque se gasta tanto dinheiro em subsídios de doença? Já teremos pensado que as”baixas” desnecessárias ou fraudulentas delapidam milhares de contos por ano? Já teremos pensado que uma greve inoportuna dos transportes pode acarretar a perda irreparável de encomendas para o estrangeiro e o consequente custo em divisas que são tão necessárias? Já pensamos que a não entrada de contribuições para a segurança social, seja por fraude, seja por impossibilidade financeira das empresas, se repercute nas receitas actuais e na solvabilidade futura do sistema? A ideia da solidariedade é fundamental, mas ela não se encaixa nessa visão estatista. Há um ditado popular apropriado: “Ajuda-te a ti mesmo que deus te ajudará”. Eu diria em termos políticos, que a evolução social apela para formulas em que a solidariedade para com o futuro individual e colectivo se repense e efective em termos inovatórios. Cada indivíduo, cada pessoa, deve ser, ele próprio agente de solidariedade. E isto comporta deveres. Não vale a pena falar em solidariedade quando se exige o máximo para nós, para o nosso sector, para a nossa classe, e se esquece o resto da comunidade.

Só mais uma nota: quando se diz que o País consome acima das suas possibilidades não se está a arranjar um pretexto, está a usar-se sim um dado da realidade económica estatisticamente comprovado. O mesmo acontece noutros países onde foram impostas restrições, desvalorização da moeda, ou de aumento de preços de bens e serviços essenciais, ou de restrições salariais, ou de recuos nos benefícios sociais, ou de aumento de impostos. Não visiono outra solução que não seja a de nos tornarmos mais desenvolvidos, mais produtivos, mais combativos economicamente e menos agrestes socialmente. O desafio respeita a nós todos.

Lisboa 13 de Setembro 1983