quinta-feira, 3 de novembro de 2011

REFORMA DO SISTEMA EDUCACIONAL

A sociedade de amanhã vai ser, muito provavelmente, uma sociedade qualitativamente diferente. Qualitativamente diferente, no sentido de que não conseguirá, por certo, alcançar uma ordem social melhor sem base numa assunção reflectida e consciente do próprio Homem como ser solidário perante os outros e perante a sociedade.

Este tipo de valor, esta exigência basilar, há-de ser fomentada desde logo na Família e na Escola. É preciso, pois, que o sistema educacional comporte uma reforma capaz de levar os jovens a assumir o seu mais livre desenvolvimento.

Acontece, porém, que o desenvolvimento integral da personalidade de cada um não se atingirá nunca enquanto outros seres humanos, nossos cidadãos – e porque não dizê-lo nossos irmãos? -, não puderem, também, dispor das mesmas condições de desenvolvimento. Daí que um dos eixos da reforma educativa terá de assentar numa perspectiva, sempre livre e aberta, de qual o papel do homem no Estado e na sociedade, para que o Estado seja democrático como emanação de uma sociedade democrática.

Não bastará, pois, que o ensino seja tecnicamente adequado. É preciso que nele se fomente o debate e a consciência cívico -cultural das relações e dependências económico-sociais existentes e se gere sentidamente um fundo de consciencialização quanto à necessidade de uma actuação comum e solidária na nossa sociedade e no mundo de interdependências em que vivemos.

Não quero com isto recusar, de modo algum, a necessidade de a reforma de ensino se orientar para uma correcta adaptação da formação que se presta às condições reais da sociedade. Isto não significa que o ensino deva servir a economia. Mas não pode ignorar-se também que um ensino divorciado dos caminhos efectivos e potenciais do mercado do emprego significa um bloqueamento para a juventude.

O ensino deve, pois, proporcionar aos jovens uma orientação e uma formação que lhes permita vir a encontrar uma entrada efectiva no mundo do trabalho. Mas tem de proporcionar igualmente uma capacidade de pensamento e de inovação que permita, ele próprio, uma renovação das estruturas económicas, por forma a que estas não se orientem pelo objectivo exclusivo do lucro, mas, sobretudo, pela finalidade essencial do pleno emprego e do livre e harmonioso desenvolvimento das capacidades individuais e da concretização das necessidades sociais.

Isto supõe uma cooperação de docentes e discentes. Isto impõe uma acção concertada do Estado, das associações de estudantes e de famílias, do movimento sindical e das autarquias, das organizações empresariais também, no sentido de se procurar ajustar por consenso a concepção, o planeamento, a execução e o controlo da reforma do ensino.

Se não queremos efectivamente uma subordinação do Homem à Economia e uma sujeição do poder político ao poder económico, não nos é lícito ignorar, também, as constrições que se nos deparam no crescimento económico, base de uma segurança material que é condição para uma vida mais digna."

Coimbra, 1981