E a azáfama só esfria com o chamar dos fiéis à missa. É de um sopro que se enverga a veste adequada e se animam os últimos toques na figura. Em duas pernadas alcança-se a Sé. Não faltam, ali a religiosidade e o fervor do povo aldeão.
Lá, onde a neve não tomba e o vento não uiva como matilha, a noite, amena, sente ressoar os magotes de gente que acorrem ao dlim-dlão da sinalhada. Vêm pelo escuro que a iluminação pública não cabe no orçamento camarário: e um a um, depois cada qual fura o seu poiso, a fatiota a tresandar à naftalina do baú e a carantonha impante do porte teso.
Ita missa est, salva-se o menino com o beija-pé, ao rés do presépio erguido na nave central. Estoiram conversadas, então, no adro. Badalam os sinos das torres e ao longo dos passeios o retorno ao casario é apressado e buliçoso. Já no quente do lar, passarinha pelos quatro cantos o bafo dos fritos. Adrega, por vezes de se juntarem famílias. E as recordações rebentam, em uns, no palavreado nervoso; noutros, é o falar monossilábico que lhes atesta a lembrança: - Senhora do Amparo como está longe a minha serra! – A nós, angolanos, nunca nos arribou de sentir tamanha saudade.
Só a entendemos quando sucede, também, faltar-nos o espaço aberto dessas lonjuras tropicais…
Mas o odor das farturas e o tostado da broa tornam os espíritos à realidade. Toca de apertar à roda da mesa. E surge o arroz de polvo. Travessas grandes, a abarrotar. Desentaramelam-se as línguas. Transbordam os copos. Há gargalhadas ao burlesco dos sucedidos. Alegria. E franqueza a soltar-se dos olhares, e amizade a perceber-se nos abraços. Somem-se os empadões. Renovam-se as doses. Vá de se fartar o bandulho! E sobre o rum-rum da festarola, essa noite angolana, profundamente negra e sossegada…
Lá, onde a neve não tomba e o vento não uiva como matilha, a noite, amena, sente ressoar os magotes de gente que acorrem ao dlim-dlão da sinalhada. Vêm pelo escuro que a iluminação pública não cabe no orçamento camarário: e um a um, depois cada qual fura o seu poiso, a fatiota a tresandar à naftalina do baú e a carantonha impante do porte teso.
Ita missa est, salva-se o menino com o beija-pé, ao rés do presépio erguido na nave central. Estoiram conversadas, então, no adro. Badalam os sinos das torres e ao longo dos passeios o retorno ao casario é apressado e buliçoso. Já no quente do lar, passarinha pelos quatro cantos o bafo dos fritos. Adrega, por vezes de se juntarem famílias. E as recordações rebentam, em uns, no palavreado nervoso; noutros, é o falar monossilábico que lhes atesta a lembrança: - Senhora do Amparo como está longe a minha serra! – A nós, angolanos, nunca nos arribou de sentir tamanha saudade.
Só a entendemos quando sucede, também, faltar-nos o espaço aberto dessas lonjuras tropicais…
Mas o odor das farturas e o tostado da broa tornam os espíritos à realidade. Toca de apertar à roda da mesa. E surge o arroz de polvo. Travessas grandes, a abarrotar. Desentaramelam-se as línguas. Transbordam os copos. Há gargalhadas ao burlesco dos sucedidos. Alegria. E franqueza a soltar-se dos olhares, e amizade a perceber-se nos abraços. Somem-se os empadões. Renovam-se as doses. Vá de se fartar o bandulho! E sobre o rum-rum da festarola, essa noite angolana, profundamente negra e sossegada…
…Inverno, friorento e choramingas, já arribou a esta parte. Veio agreste, de chuvaria a rebentar em cambulhada e ventana a zunir que nem foguete. Comprime-se a gente no Chiado, calos doridos das pisadelas corpo amassado dos encontrões. Não se lobriga espaço num eléctrico, tão apinhados que nem agulha lá cabia. E é um dó de alma o meu guarda-chuva, esfanicado sob a tormenta – Oh, calmos Natais do meu sertão!...
Henrique Nascimento Rodrigues
Publicado a 25 de Dezembro de 1959 num jornal diário em Lisboa
A fotografia a cores foi feita, pelo Henrique, em 2006, na Missão da Huila. A toalha da mesa de Natal é a mesma que usamos em nossa casa, nesssa noite, ano após ano.