quarta-feira, 24 de outubro de 2012

SINTO-ME INCÓMODO PARA O SISTEMA


“Nesta primeira entrevista desde que tomou posse, saiba o que o novo Provedor de Justiça, Nascimento Rodrigues pensa, (…) das funções que exerce (…)”
Entrevista a “O Diabo” 19 de Setembro de 2000

Sente que a figura do Provedor de Justiça é incómoda para o sistema?

Nascimento Rodrigues – “ Sinto. Sinto-me incómodo para o sistema, e não me importo de ser incómodo para o sistema, enquanto perceber que o sistema não entende que deve reagir com muito mais rapidez e com muito mais justiça perante o cidadão. Sinto-me incómodo para o sistema quando reclamo porque é que ele não dá respostas ao cidadão, que é uma coisa elementar. Pode dar uma resposta inclusivamente para dizer que o cidadão não tem razão. Isso é pedagógico! Porque eu vejo os direitos dos cidadãos, mas também vejo os deveres. Se a Administração entende que está a proceder bem, deve dizer isso. E uma das coisas que eu mais verifico é que a Administração leva muitíssimo tempo a responder.”
A Administração tem um “saco roto” onde caem as reclamações?
Nascimento Rodrigues – “ Eu não sei se tem um “saco roto”, até porque não tenho uma análise muito completa acerca do que é a nossa Administração Pública. Eu venho da sociedade, não venho da comunidade jurídica propriamente dita. Venho do mundo da sociedade real, e portanto tenho um pouco o sentimento dos cidadãos reais. (…). Tenho a sensação que, em muitos processos, as grandes Câmaras tratam mal os seus munícipes.
Que tipo de queixas são mais comuns contra os órgãos autárquicos?
Nascimento Rodrigues – “ Tenho imensas queixas contra licenciamentos que não foram autorizados. Ou contra licenciamentos que foram autorizados sem serem “devidamente” autorizados…
Pressente um certo “compadrio” nestas situações?
Nascimento Rodrigues- “ Não posso tirar conclusões… Mas pode acontecer isso. E fico muito perplexo em relação a um tipo de reclamações, quando nós perguntamos a uma Câmara porque é que este processo de licenciamento foi concedido nestes termos irregulares – está detectado que foi irregular – a Câmara responde: “ estamos a proceder à regularização”. Muito bem! Isso é corrigir um acto que a Administração verificou que era ilegal, ou irregular! Está certo. Mas quanto tempo leva a corrigir este acto irregular? Eu tenho, nesta Provedoria, alguns processos com anos! Mas leva anos a corrigirem um acto irregular? Nós vamos insistindo e a resposte é: “ agora, para efeitos de regularização, pedimos mais este documento, ou mais aquele”… Isto é que eu chamo, em linguagem corrente portuguesa “o embrulha”! E eu obviamente que aí não vou ter contemplações. Eu vou perguntar às Câmaras quando é que elas terminam os seus processos: que processos de contra-ordenação é que aplicaram às pessoas a quem não licenciaram, ou licenciaram irregularmente; qual a coima aplicada; quanto tempo levou o processo de contra-ordenação. Eu vou ser muito incómodo nestes casos!
Pelo tom que usa, parece que passa por aí alguma indignação… alguma surpresa…
Nascimento Rodrigues – Na minha vida profissional nunca tive contactos com Câmaras Municipais e agora estão-me a passar estes processos pelas mãos e estou mesmo a ficar indignado, é verdade!

IN “ O Diabo 3ª feira 19 de Setembro