domingo, 3 de abril de 2011

CARTA AOS MEUS TREZE NETOS (2)

Há uma coisa que eu não admito seja a quem for: quererem por em foco aquilo que eu valho ou aquilo que eu possa fazer. Porque, quando a isso me provocam, a minha reacção não costuma ser boa. Eu sou superior aos meus próprios ideais, por saber afastá-los quando necessário. Quando se tem um sonho e ele é irrealizável, a questão está em se procurar uma compensação e encontrá-la!

E há tanta compensação que nós temos à mão e desprezamos, que só o orgulho nos faz não vê-las . Porque há muita coisa que vale a pena nesta vida e nessas coisas eu buscarei a compensação do que mau se passou. Mas fugir é uma cobardia!

Eu não fujo à luta nem a procuro. Antes, busco compensações para ela.

Hei-de provar, custe o que custar, que a vida é uma questão de vontade própria e não de circunstâncias favoráveis: nós queremos ou não queremos, e só isso.

A vida nunca para e nós temos que acompanhar a vida. Sinto uma fé inabalável em tudo o que eu desejo e quero alcançar; sinto que eu posso e quero fazer alguma coisa de útil e valioso – e que sou capaz muito capaz mesmo, de tudo conseguir. Mas mais do que nunca eu lutarei com ardor e fé, com entusiasmo e força, por outra coisa.

Nem tudo, é certo, eu posso ter; mas aquilo que eu tiver de deixar para trás, será substituído por outra coisa qualquer que valha a pena eu obter e lutar por ela – é a lei das compensações.

Não acredito que a vida seja má; acredito unicamente que ela por vezes, nos possa apresentar um ou outro obstáculo que nós não podemos saltar. Rodeemo-lo então e prossigamos no caminho que quisermos percorrer.

Deus há-de auxiliar-me e eu vencerei, tenho a certeza. Porque Deus já me fez a primeira vontade e já me deu o primeiro desejo que lhe pedi: ser eu mesmo



Lisboa 1958