Este é o meu quarto de estudante: a cama, o guarda-fatos, a mesinha com o rádio, a cómoda com o retrato dos Pais, a secretária cheia de livros.
Meia – noite! Meia – noite, a solidão do meu quarto, o tiquetaque do relógio de cabeceira e o fumo azulado, acobreado, da ponta do meu cigarro.
Meia – noite nesta terra desconhecida, em que o estrangeiro sou eu, perante ela; em que a tristeza é mais triste e menos alegre do que na minha terra bendita;
Solidão … sonho… tristeza… uma bola de fumo que sai da boca, fica a rolar, a rolar, e se desfaz lá em cima no tecto; um coração que chora baixinho pelo bater monótono e pungente destas 12 badaladas monocórdicas, um sorriso triste e saudoso ao canto dos lábios quentes…
Oh meu Deus, porque é que a vida não é um “mar de rosas”?
Porque é que eu me sinto tão cansado, com tanta vontade de dormir… ! Decididamente, é difícil de adormecer! Não consigo conciliar o sono, nem descansar tampouco das canseiras do dia de ontem.
Ontem, porque já são três horas da madrugada! Como vai amanhecer o dia de amanhã? Amanhã, quando acordar, e vir lá fora a mesma paisagem de sempre, a mesma terra estranha e as caras que não são as caras que eu queria ver, de mansinho me erguerei e num murmúrio hei-de dizer para mim mesmo:
“Bonjour tristesse”.
Lisboa Outubro de 1958