terça-feira, 12 de abril de 2011

PALAVRAS NO AR

NÃO!!!

Nesse segundo antes do outro segundo o telemóvel tocou. Sempre pensei que ia saber como seria esse segundo antes do segundo seguinte. “Nuno, querido é o pai… O pai morreu, Nuno."

NÃO!!!

Voou a minha vida naquele grito pelo meio das árvores. “Nuno, querido.” Nos segundos antes do dia anterior nada fazia prever. Telefonei à mãe, talvez fosse lá jantar, mas tu tinhas-te sentido mal. Estavas a vomitar, foste internado. Nos segundos antes desse dia, a mãe telefonou a dizer que te ia ver, para não me preocupar. Só uns segundos antes do telefone tocar.

NÃO!!!

Tu não tinhas parado como era o nosso medo. Tu estavas a conseguir pai. Como é incrível a volta que deste à tua vida. Tu que não sabias trabalhar com o telemóvel, o que para alguém que trabalhou a vida toda como tu era intrigante. Para alguém como tu em que trabalho é esforço, trabalho é dedicação, trabalho é nunca desistir, trabalho é sermos mais e melhores, esse pequeno e simples objecto não fazia o sentido de uma caneta. Tu deste outra vez a volta. Escreveste com a caneta os teus apontamentos de informática que só agora vi. Não percebi o que escreveste. Não me explicaste enquanto podias. Como sempre. As meias palavras escritas ou ditas eram afinal a nossa especialidade. Parece que quando flutuam no ar depois de sair da nossa alma elas perdem sentido. As palavras ditas nunca são as mesmas que as sentidas no coração. Deve ser por isso que não as sabia dizer-te. Parece que ainda agora não as sei colocar aqui. Não sei. Mas sei que tu as conhecias melhor que ninguém. Entre o “sim fui a Espanha esta semana” e o “não lutes com o teu irmão” estavam as outras palavras. Aquelas que o teu olhar profundo não sabia esconder. Eu sei que eram essas palavras que o ar devia ter trazido e ficaram aí. Mas a Mãe sabia trazê-las de um coração para o outro. E a vida fazia questão todos os dias de me as mostrar na intensidade de cada momento. Mas escreveste-as no teu blogue. As palavras. Não aquelas que ambos sabemos existirem mas as outras da tua vida. De África. Da política. Essa tua vida que nós conhecemos pelas palavras dos outros. De África muito pouco. Da política demasiado. Mas o teu blogue permanece. E com ele as tuas palavras para quem as quiser escutar. As outras escrevo-as para garantir que o ar não as leva nunca:


“Amo-te Pai”