sábado, 21 de julho de 2012

A ESSÊNCIA DA CONCERTAÇÃO SOCIAL


Portos têm acordo para reestruturar. O sector portuário protagonizou um acordo inovador na história da concertação social. Com o pacto agora assinado os trabalhadores e operadores deram um passo decisivo na reforma dos portos nacionais
In Diário de Notícias 13 de Julho 1993

Na vida das instituições, como na dos homens, há momentos marcantes. Para o Conselho Económico e Social, cujo tempo real de vida não atingiu sequer um ano, este é um momento marcante pelo significado e pelas características de que se revestiu o seu contributo no processo de concertação social no sector portuário.
Sublinharia, em primeiro lugar, que a intervenção do CES ocorreu no momento apropriado. Dezenas de reuniões de negociações já tinham tido lugar entre os parceiros sociais do sector, e outras tantas entre o Ministério do Mar, representantes sindicais e dirigentes patronais. O Conselho viu-se solicitado a prestar os seus bons ofícios, portanto, apenas e quando um longo mas necessário processo de diálogo e de conversações entre as três partes já tinha sido percorrido, abrindo a porta a entendimentos parcelares, à clarificação das posições respectivas e ao amadurecimento de um clima propiciador de um desfecho final positivo.
O enquadramento sob que foi despoletado o pedido de intervenção do CES revelou-se, assim, o mais propício, porque permitiu que ela não fosse nem precipitada, nem porventura tardia. Mas este é um mérito que cabe apenas às três partes no processo de concertação, e não ao Conselho.
Em segundo lugar, gostaria de recordar que o surgimento do CES no âmbito destas conversações tripartidas se fez sem pressão de quem quer que fosse. Pelo contrário: todas as partes envolvidas no processo sentaram-se com espontaneidade e com naturalidade à volta da mesa do diálogo travado nesta mesma sala e senti sempre que aqui estiveram com a consciência plena de que o Conselho simbolizava e oferecia um espaço de isenção, de liberdade e também de responsabilidade solidária. Voluntariamente, as partes assumiram o compromisso, que cumpriram, de assegurar as condições mínimas sem as quais não há diálogo sério e frutuoso, ou seja: boa fé nas posturas, discrição nos procedimentos, esforço recíproco para entender as razões dos outros e empenho persistente na busca das soluções possíveis, que nunca são as ideais, mas são sempre, exactamente porque possíveis e viáveis, as soluções melhores.
Nada disto impediu que, no decurso das conversações, surgissem confrontos abertos de posições, por vezes uma frontal dureza de exigências, aqui e ali resquícios de bloqueamentos, outras vezes, alguns difíceis momentos de arrastamento na progressão dos assuntos. Mas tudo isso é natural, compreensível e legítimo, porque faz parte da essência da concertação social. Esta supõe e implica tolerância, paciência e respeito mútuos, tal como pressupôe e exige limites de razoabilidade, percepção das realidades inultrapassáveis, convicção de que só se consegue construir solidamente com os outros e não contra os outros.
E por isso este pacto de concertação social não tem nenhum perdedor e não tem nenhum ganhador. Se ganhador há, ele é, seguramente, o País. O mérito, esse sim, existe e é justo reconhecê-lo: cabe por inteiro aos representantes do Governo, através do Ministério do Mar, e aos dirigentes sindicais portuários e das organizações patronais do sector.
E porque assim é, eu diria que não foi o Conselho Económico e Social que dignificou este processo concertativo. Ao invés: foram as três partes dele signatárias que dignificaram o papel do Conselho Económico e Social. É, então, de elementar justiça que como presidente deste órgão vos dirija o meu reconhecimento, o que gostosamente faço, e faço com a simples e tradicional expressão portuguesa, que é a de vos dizer “muito obrigado”.

Discurso proferido pelo presidente do CES por ocasião da assinatura do “ Pacto de Concertação Social no Sector Portuário”. Lisboa, 12 de Julho de 1993