Está a chegar a hora em que se esgotarão as condições para um acordo de concertação social.
A relação triangular que singulariza a concertação social, por um lado, e o papel positivo e estabilizador que pode exercer no plano da necessária articulação das políticas económica e social e da sinergia do desenvolvimento sustentado do país, por outro lado, induzem-me de há muito ao entendimento de que ninguém deve interferir no decurso das negociações tripartidas.
Este é um processo e um assunto exclusivo das três partes nela envolvidas até ao momento em que o concluam, com ou sem sucesso. Por isso não vou, neste soar da 25ª hora, infringir regras que a lei e o meu próprio entendimento impõem. Nada me impede, porém, de formular uma sintética reflexão publica sobre a concertação social, hoje e em Portugal, observando os limites da “não ingerência”a que atrás aludi. É usual falar-se da concertação social como um processo tripartido de negociações. De facto, trata-se de negociações entre Governo e os parceiros sociais em pé de igualdade. Todavia, este plano de igualdade negocial não pode adulterar o estatuto peculiar de cada parte. Significa isto que os parceiros sociais trazem para a mesa das negociações a defesa dos interesses de que se reclamam representativos e não a defesa do interesse nacional.
O Governo, esse, discute e intenta alcançar compromissos com os parceiros sociais, mas sempre sob a veste – igualmente legítima e natural - de representante, democraticamente mandatado pelo voto popular, do interesse nacional.
Isto tem de implicar negociações, sob pena de se transformar num diálogo de surdos ou resultar num “diktat”unilateral. Partilha de esforços, partilha de sacrifícios, partilha equitativa de benefícios através deles consensualmente alcançados - eis o significado mais fundo da concertação social, do meu ponto de vista.
Nesta 25ª hora da concertação social, é preciso trazer à colação esse significado. Talvez não valha nada.
Eu acredito que vale o que vale: porque se alimenta de valores de solidariedade e de coesão nacional, arranca de raízes de responsabilização e de confiança comum, aposta na conciliação entre emprego, capital e trabalho, Estado e sociedade e porque fraterniza as gerações do país – vale a pena vencer o desafio da concertação social. Na hora certa e irrepetível.
Excerto de um artigo publicado a 10 de Outubro 1994 (O Público)
Excerto de um artigo publicado a 10 de Outubro 1994 (O Público)