quarta-feira, 2 de março de 2011

O Silêncio do Mato

Parto amanhã para o Songo. Não vai ser longa a estadia. Na quinta - feira à noite já estou de volta. Vou para caçar, evidentemente! Sabes bem, que, eu sou um apaixonado pela natureza da minha terra e nada melhor do que a caça para nos pôr em contacto com ela e sentirmos bem fundo de nós, a maravilha da terra e dos seus elementos. Não é propriamente, melhor, especialmente, a caçada em si que me traz alegre: é sobretudo, poder estar só no meio do grande mato e sentir à minha volta tudo quanto conheço e mais querido me é: a terra desconhecida.

Como posso eu contar-te toda a satisfação que sinto por voltar a percorrer os matos da minha terra, voltar a sentir um enorme entrechoque de sensações dentro de mim, sei lá que amalgama de sentimentos! Sei que não posso descrever-te – era impossível! - o que eu sinto quando ando assim de noite a percorrer os campos, com a lua, as sombras, o enorme silêncio destas noites… meu Deus, há tanta coisa que se sente e não se sabe contar! Mas é isto, afinal, o que eu adoro em Angola e me prende irremediavelmente: a minha terra – a própria terra em si, com toda a beleza e majestade destes campos e matos, o silêncio das grandes noites, o luar, o canto das cigarras o mistério que em tudo paira. Isso sim, isso é Angola, isso é que eu amo. Isto faz parte de mim. Jamais poderei prescindir desta beleza sem enorme sacrifício. Sei lá quando poderei, de certeza, voltar a Angola e assistir de novo a todas estas coisas.
Mas esta caçada tem duas novidades: em primeiro lugar é de dia, a partir das quatro da madrugada (de quinta portanto) e, depois, garantiram-me, que encontraríamos caça grossa. Creio que é uma região em que ela abunda e por isso, desta vez, já não vou à aventura. Espero, portanto, encontrar caça e, se Deus quiser, poder filmá-la, o que seria interessantíssimo. Vamos em busca de pacaças e elefantes. Ocasiões destas há poucas.
Desta vez, se Deus quiser, a par das saudades que levar destas férias, levo também uma vontade grande de lutar e vencer a minha vida; mas não posso deixar de considerar Lisboa, hoje mais do que nunca, como uma situação transitória. E isso, claro, ainda me dará mais forças para regressar depressa.



Agosto 1959